‘É COMO ANDAR DE BICICLETA. UMA HORA, TIRA A RODINHA’, DIZ CHEFE DE COMPLIANCE DA ODEBRECHT

Aumentar os investimentos em compliance é uma questão de sobrevivência?
É de sobrevivência não só para a Odebrecht. Não só para uma empresa que está em crise. As empresas que não passarem a adotar práticas de conformidade vão ficar no passado, pois quem está fazendo conformidade não vai querer fazer negócios com elas. Serão asfixiadas.
(Olga Pontes, nova executiva de Compliance da Odebrecht).

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Olga Pontes afirma que empresa poderá ‘se tornar referência’ em conformidade após renovação motivada pela Operação Lava Jato.

Cerca de um mês após o conteúdo da delação dos 78 executivos e ex-executivos do grupo Odebrecht se tornar público e tomar o centro do noticiário nacional, a executiva Olga Pontes assumiu a função de diretora de compliance da empresa. É ela a responsável por implementar as prometidas – e também obrigatórias – mudanças na forma de gestão do grupo, que se diz focado em se reinventar longe das práticas de corrupção.

Antes de maio, Olga atuava na área de compliance da Braskem, outra empresa envolvida na Operação Lava Jato. “A área não existe para garantir que [a corrupção] não aconteça. Existe para evitar que aconteça. E existe também para identificar com tempestividade quando ela acontecer”, disse a diretoria em entrevista ao G1.

Olga diz que não encara seu cargo “como um emprego”, mas “como um prazer” e diz que o trabalho de renovação da Odebrecht poderá “se tornar referência” em boas práticas corporativas.

Leia a seguir a entrevista com a chefe de compliance da Odebrecht:

O que já mudou na Odebrecht desde o acordo de leniência firmado com o Ministério Público no ano passado?

Estamos em processo de transformação. Se a gente fizer um exercício do que é hoje a organização Odebrecht, sendo uma empresa de controle familiar, como outras que passaram pela Lava Jato, estamos sendo muito mais agressivos em um curto espaço de tempo. O objetivo é fazer com que ao final do processo de monitoramento as empresas do grupo Odebrecht sejam reconhecidas como uma referência de conformidade. Se não existisse a intenção de recuperar e transformar a empresa, para que ela passe a ser uma influenciadora de boas práticas, não teria por que ter o processo de monitoramento.

Quanto tempo irá durar esse processo de monitoramento? Estar nessa situação não é desconfortável?

São 3 anos. É o tempo que a própria Justiça identifica como o necessário para maturação. Os monitores estão lá para nos apoiar. Eles vão dar recomendações e voltar a campo para verificar se a gente as implementou. É como andar de bicicleta. Uma hora, você tira a rodinha. Os monitores estão sendo as rodinhas que a organização precisa à luz das autoridades para que a gente não caia daqui para frente.

Qual o maior desafio nesse momento?

São vários, em todas as áreas. Seja na área de conformidade, na área comercial, de captura de novos contratos ou no relacionamento com terceiros, porque uma crise reputacional abala toda a estrutura da organização. As priorizações são de todas as áreas para retomar a credibilidade e seguir em voo de cruzeiro nos negócios.

Aumentar os investimentos em compliance é uma questão de sobrevivência?

É de sobrevivência não só para a Odebrecht. Não só para uma empresa que está em crise. As empresas que não passarem a adotar práticas de conformidade vão ficar no passado, pois quem está fazendo conformidade não vai querer fazer negócios com elas. Serão asfixiadas.

Algumas das empresas envolvidas na Lava Jato, mesmo tendo em alguma medida áreas ou programas de conformidade, acabaram envolvidas em escândalos, como a Braskem [antes do atual posto, a executiva trabalhava na área de compliance da petroquímica]. O compliance falhou nestes casos ou não foi devidamente implementado?

De maneira nenhuma. Uma área, um processo ou uma cultura de compliance não existem para garantir que não aconteça [a corrupção]. Existem para evitar que aconteça. E existem também para identificar com tempestividade quando ela acontecer. Tanto que os acordos de leniência que são firmados no mundo afora preveem que, caso se encontre algo relacionado à corrupção depois da assinatura do acordo, se reporte prontamente às autoridades. O que significa que está se implementado um sistema robusto e capaz de identificar o que não era identificado no passado.

Ou seja, qualquer programa de compliance terá sempre limitações?

Tudo tem limites. Por isso é tão importante fazer uma avaliação de risco para concentrar suas energias e controles naquilo que traz maior risco para sua organização ou operação. A própria lei anticorrupção prioriza algumas áreas de risco, como os pontos de contato com agentes públicos, que podem gerar oportunidades de atos ilícitos ou impróprios como recebimento de presentes, entretenimento e patrocínio. As leis já sinalizam onde as empresas devem focar suas energias para combater a corrupção.

E do ponto de vista profissional, como é estar nesse cargo nesse momento de crise de imagem da empresa?

Eu não encaro como um emprego, eu encaro como um prazer. Eu amo o que eu faço. Trabalho com conformidade há 20 anos. Não tenho interesse em fazer outra coisa. Para profissionais que gostam de conformidade, estar vivendo uma situação de crise como essa e poder ter a oportunidade de desenvolver e implementar, e ter apoio principalmente, é o desafio dos sonhos. Não estou nadando contra a maré. Estou nadando com todo mundo junto. Estamos visualizando nos tornar referência.

Mas essa transformação está implicando também num encolhimento da empresa, não?

O encolhimento em si não foi associado apenas à questão da Lava Jato, mas também à crise, que não afeta somente as empresas que estão envolvidas em alguma crise reputacional ou no epicentro da Lava Jato. O objetivo é garantir o crescimento sustentável e sólido, porque crescimento sem conformidade pode se tornar não sustentável.

Fonte: G1



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